1. Tenho procurado escapar, reconheço que dificilmente, à enxurrada de comentários com que os media, em especial as estações de TV, a toda a hora procuram trucidar-nos para nos convencer das virtudes (nenhumas) e defeitos (infinitos e perigosíssimos) do OE/2013 esta semana aprovado na AR.
2. Com efeito, os perseverantes Crescimentistas - aliados aos incansáveis adversários do neo-liberalismo e a Advogados do Estado Social e do Apocalipse - têm estado a debitar a toda a hora, servindo-se de inesgotável sabedoria e eloquência, a sua douta opinião sobre a terrível situação em que a economia do País se encontra bem como a sua disponibilidade para a transformar, de súbito e sem esforço – adoptando formulas mágicas de expansão económica sem meios - numa economia sadia e dinâmica, capaz de suportar um Estado Social avançado e exemplar.
3. Em vez de me deixar purificar por essa poderosa carga mediática, tenho procurado aplicar algum (pouco) tempo disponível para prestar atenção aos números algo bizarros do OE/2013, parecendo-me que vale a pena dedicar algum espaço de comentário a essa previsão da actividade financeira do Estado para o próximo ano.
4. E, quando digo números bizarros, refiro-me, em 1º lugar, à constatação de que, após 2 anos (2011 e 2012) em que a despesa pública (total e primária) caiu significativamente (-4,6% e -10,2% a despesa total e -7,2% e 11,3% a despesa primária), para 2013 prevê-se uma estranha inversão de marcha, CRESCENDO a despesa total e primária 3% e 3,2%, respectivamente.
5. Pior ainda, verifica-se que esse aumento da despesa se fica a dever, quase exclusivamente, às despesas com pessoal e com prestações sociais, que deverão crescer 3,7% e 2,1%, respectivamente - como resultado da reposição dos subsídios (1 para os activos, e 1,1 para os pensionistas e reformados) cujo pagamento esteve suspenso em 2012 como se sabe mas que a famosa jurisprudência do T. Constitucional obrigou a repor pelo menos em parte...
6. Para tornar as coisas mais negras, verifico que esse agravamento da despesa será financiado com um aumento da receita dos impostos, (+7,5%), em especial dos impostos sobre o rendimento (+20%!), sobrecarregando um sector privado que tem sido o único motor do difícil processo de ajustamento da economia...
7. Tenho pensado no que seria a reacção de um Observador Externo Não Identificado (OENI), distante das novelas internas mas conhecedor da problemática financeira e económica do País, ao deparar-se com este Orçamento. Creio que essa reacção não seria muito diferente de...
8. ...”Mas estes tipos devem estar loucos...então agora, na altura mais crítica da aplicação do PAEF, quando o próprio FMI reconheceu que estaria cumprido cerca de 2/3 do esforço de ajustamento previsto para todo o prazo do Programa, quando deveriam tomar todas as cautelas para continuar a reduzir a despesa pública, é que se lembram de aumentar a despesa e, mais grave ainda, de subir os impostos directos com a economia em séria contracção?!”
9. O caso não é para menos...mas a verdade é que continuamos, a toda a hora, escutando apelos lancinantes para mais uma intervenção do T. Constitucional, no sentido de purificar o OE/2013, expurgando-o de ominosas inconstitucionalidades, quiçá ajudando a que venha aí mais um impulso na despesa e mais um agravamento de impostos...”estes tipos devem estar mesmo loucos! Diria o tal OENI”...E sem remédio, acrescentarei...
13 comentários:
No fundo, o gajo da Venezuela e a lambisgoia da Argentina é que têm razão: a Constituição de um Estado é uma coisa que se maneja ao sabor e de acordo com os interesses do momento e das forças políticas que MANDAM.
Quanto aos subsídios dos FP, pelo que tenho ouvido deles mesmos, a sua expectativa é que, além de não receberem nenhum subsídio, pois a coisa é sonegada pelos impostos, ainda terão, no final do ano, menos rendimento do que em 2012.
Portanto, estou como o caro, com uma sensação absoluta de estranheza e de fragmentação interior...
MUITO BEM ESCRITO ESTE POST!
Só posso tirar a conclusão que a constituição não serve os interesses do País. Pelo menos nesta fase.
Outra conclusão é a de que, mais uma vez o sector privado é subjugado pelos superiores interesses de parte da nação.
Louve-se, porém, o aumento do orçamento para a presidência da república e para o tribunal constitucional que, no seu conjunto, consomem uns 20 milhões de euros.
Ora, assim fazendo umas contas por alto, para uma empresa libertar 20 milhões de euros será necessário empregar, assim por alto, 7 mil pessoas, mais ou menos. Portanto, há 7 mil pessoas neste país que podem agradecer a sua situação de desemprego à presidência da república e tribunal constitucional directamente. Que, pelos vistos, a sua noção de equidade passa por serem aumentados enquanto os seus patrões são atirados para o desemprego às mãozadas, numa situação de moralidade deplorável.
Quantos desempregados gerou indirectamente a acção da presidência e do TC nunca viremos a saber. Serão numa ou duas ordens de grandeza acima dos desempregados directos. Mas pelos menos poderiam colocar uns cartazes na porta dos centros de emprego a dizer "Alegrem-se valeu a pena, fizeram os donos do estado mais felizes!"
O resto do aumento da despesa, pois equidade é isso mesmo, os senhores todos devem ser aumentados, pois então...
Senhor Stoudemire,
Para além do fino recorte literário do seu comentário, sempre de relevar, a conclusão que nos oferece não podia ser mais apreciável: confessar-se possuído de um estado de (ruidosa?) fragmentação interior...ou será frustração?
Caro Agitador,
A questão não é tanto a Constituição, mas a interpretação que dela se faz...
No caso em apreço, encontrar violação aos princípios da igualdade e da proporcionalidade, consagrados no texto fundamental, na suspensão dos subsídios de férias e de Natal - por ser aplicada apenas ao sector público -é que me parece uma descoberta incompreensível...e as centenas de milhares de desempregados bem como as centenas de milhares de emigrantes de onde saíram, do sector público? O facto desse imenso exército de deserdados ter saído apenas do sector privado não constitui uma muito mais violenta ofensa dos princípios da igualdade e da proporcionalidade? E o Tribunal alguma vez se preocupou com essa terrível realidade?
Valha-nos Deus!
caro Tonibler,
Era certo e sabido que o ilustríssimo Comentador iria uma vez mais voltar-se para Belém, seu alvo de estimação...
Não o censuro por isso,neste contexto de apreciação da loucura orçamental em que mergulhamos por força das mentes mais iluminadas deste País à beira mar plantado, mas faço-lhe o reparo de não ter referido, por exemplo, os bem mais vibrantes casos dos Gabinetes dos Representantes da República para a Madeira e para os Açores...já se esqueceu?
Aí teria que considerar um equivalente métrico de muitas dezenas de milhares de (des)empregos...
Ai essa memória de matemático virtuoso...
Talvez não tenha importância nenhuma esclarecer, caro Tonibler,mas já agora critique sem ser com base em erros aritm+eticos, as despesas aumentaram porque se tem que considerar pelo lado da despesa o subsídio que se vai depois cobrar pelo lado da receita. Na contabilidade de uma empresa como é que consideraria esta alteração? Só por uma das colunas? Ou olharia os dois lados para fazer o balanço?
Cara Suzana,
Perdão???? Deve lapso, mas aumenta-se a despesa porque vai haver um subsídio que se cobra do lado da receita???? E também me vão fazer isso a mim? É que se fosse assim, a minha crítica quanto à moralidade da coisa estaria completamente errada, isto seria um caso de polícia.
Caro Tavares Moreira,
As despesas dos demais orgãos do estado, que gosto de sublinhar têm uma utilidade muito próxima de zero, são igualmente um escândalo. Têm num entanto uma diferença "muito subtil": os representantes da república para as regiões autónomas não andaram a fazer cherry picking das medidas a autorizar para que não os afectassem,,, Destalhe....
Caro Tonibler,
Essa do cherry picking arrasa qualquer um!
Não sabia que em Belém se praticava cherry picking - mais ainda tendo por objecto medidas com incidência orçamental - mas o meu ilustre amigo deve ser uma pessoa extraordinariamente bem informada...
E já agora nos outros departamentos estatais não existem tb vestigios de cherry picking, nem na sua muito estimada Guimarães - Capital da Cultura,SAQR?
Meu caro Tavares Moreira, estamos a falar do estado português, cherry picking é desporto oficial. A diferença está no poder. As evidências estão aí, o representante do governo regional da Madeira não reclamou, não impediu, nem enviou para o tribunal para impedir, nem mandou interposta pessoa reclamar pelo chumbo de qualquer medida que o afectasse. Mas posso estar esquecido.
O que o orçamento mostra é que as entidades que reclamaram e tiveram o poder de impedir medidas que "não fossem equitativas" afinal aparecem com mais dinheiro - daquele que damos para os pobres - enquanto os desempregados vão crescendo. E posso estar enganado mas não me lembro de ver ninguém na Capital da Cultura a reclamar pela "equidade dos sacrifícios". Agora ficamos a saber que os orgãos que construíram as barreiras orçamentais vão fazer o sacrifício de abichar mais uns dinheiros dos meus e eu vou fazer o sacrifício de o pagar ou de ir para o desemprego. Equidade, portanto.
É bem por isto que vale a pena pagar impostos para o estado português. Podemos não ficar mais ricos, mas temos sempre o privilégio de assistir da primeira linha ao bater de novos recordes de falta de vergonha na cara.
Venha essa refundação, que roubado por belgas ou alemães nunca fui...
Caro Tonibler,
O representante da República não reclamou? Como sabe? Eu nada sei, confesso, não estou em condições de dizer se reclamou ou não, mas conforto-me, até indicação em contrário, na sua indicação...
Quanto à Guimarães...SASQR (há pouco a sigla ficou incompleta), também desconheço se esteve ou não activa no cherry picking que menciona, convém não esquecer que há modalidades de cherry picking bem mais soft, mas nem por isso menos eficazes na obtenção de resultados...
Neste imenso bargaining que se disputa à mesa do Orçamento (um "playing field" nada "level", antes profundamente inclinado), os resultados conseguidos não são proporcionais aos decibeis empregues na argumentação, o Senhor não deve ignorar isso...
Todos usam decibéis mas só dois têm cutelos.
Ingerível, caro Tonibler, simplesmente ingerível, a utilização do cutelo em política orçamental!
Relativamente ao OENI, sou da opinião de o mesmo iria ficar com uma opinião muito próxima de um certo General romano (Galba) a quem se lhe atribuiu este comentário: "Há, na parte mais ocidental da Ibéria, um povo muito estranho que não se governa nem se deixa governar!"
Caro Pedro,
Muito bem lembrado, sim senhor!
Enviar um comentário