Os portugueses continuam a revelar pouca consciência para a reforma, refere-se num artigo publicado a
propósito de um estudo recente que dá conta que mais de 62% das pessoas não
poupam para a reforma ou encaram esta poupança negativamente pelo impacto que tem
no seu bem-estar actual.
Uma conclusão que não surpreende,
se tivermos presente que o discurso público teimou em transmitir ao longo de
décadas a ideia de um Estado garante das pensões e a ideia, também, de que os
regimes públicos de pensões estão de boa saúde, recomendam-se, são sustentáveis
tal como funcionam e são financiados, desvalorizando, entre outras coisas, a
questão do envelhecimento da população, não explicando que a feliz notícia de
uma maior esperança de vida também tem custos que alguém vai ter que pagar, e a necessidade de criar incentivos para a poupanaça para a reforma, num quadro de estabilidade e previsibilidade.
Em lugar de repensarmos os regimes
públicos de pensões, a opção tem sido fazer cortes nas pensões através de alterações que
tem sido introduzidas na forma do seu cálculo, reduzindo de um momento para o
outro o seu montante, mesmo para aqueles que estando próximo da reforma já nada
podem fazer para se precaver em relação à quebra de rendimento. E a somar a
estas alterações temos agora cortes "ad hoc" no montante das pensões, agravados pelo aumento dos
impostos.
Temos vindo a adoptar a técnica do
cortes nas pensões,
sem cuidar de repensar os sistemas de pensões e de adoptar políticas que
incentivem, ou pelo menos não prejudiquem, a melhoria da natalidade. É verdade
que o aumento da natalidade não tem efeitos imediatos, mas essa não pode ser uma
razão para nada termos feito ao longo das últimas décadas. Os resultados estão
à vista: Portugal é o segundo dos 31 países analisados no relatório da OCDE “Doing Better for Families” que apresenta
a taxa de fertilidade mais baixa: 1,32 filhos por mulher, contra uma média da
OCDE de 1,74 filhos por mulher.
Manter as políticas de cortes
nas pensões que se vão sucedendo em função das necessidades financeiras das
conjunturas, sem crescimento da população e com o aumento da emigração e perante
uma grave crise económica e de finanças públicas não é uma solução para resolver o problema estrutural da insustentabilidade . O resultado
será um Estado com uma capacidade cada vez menor para precaver que as pessoas
na reforma não correm o risco de se tornarem pobres e que o seu nível de vida
não é abruptamente quebrado devido a taxas de substituição demasiado baixas.
Olhemos para as contas da
Segurança Social, que não incluem a Caixa Geral de Aposentações que sofre do
mesmo problema. Em 2012 e 2013 estão previstas “transferências do OE para
financiamento do défice do SSS” de, respectivamente, 857 milhões de euros e 970
milhões de euros. Os números falam por si…
8 comentários:
A CGA está fechada a nossas inscrições desde 2005, ano a partir do qual os novos subscritores passaram a descontar para a SS, pelo que a questão do financiamento se coloca de modo diferente para uma e outra.
Quanto aos estudos, não podia de facto haver nenhuma surpresa, as pessoas confiaram, confiaram e tinham boas razões para o fazer porque se havia ponto firme em todos os discursos polícos era o da protecção dos reformados e não havia exemplo na Europa de que assim não fosse.Era essa a forma de poupança para a reforma, o que permitia usar a liquidez para outras coisas em particular para pagar a compra da casa. A reforma fazia parte de um sistema jurídico que se cumpria a longo prazo e que teve uma profunda alteração há bem poucos anos, acautelando e prevenindo para o futuro, assim se garantiu. Mas a incerteza também atingiu outras formas de poupança, como os certificados de aforro ou os PPR, afinal como é que as pessoas deviam ter poupado?
"Mas a incerteza também atingiu outras formas de poupança, como os certificados de aforro ou os PPR, afinal como é que as pessoas deviam ter poupado?"
Boa pergunta.
Muitos pouparam investindo em casa própria, outros em casa secundária, terciária, ...
e, grande parte desses, está agora insolvente ou a caminho disso.
As pessoas respondem a incentivos.
Quem os incentivou é quem os esmaga agora.
Temos realmente de repensar o sistema de pensões. Essa talvez seja a reforma das reformas, pois envolve a alteração de comportamento da sociedade a vários níveis, e o futuro das novas gerações o que será dizer o FUTURO DO PAÍS.
Eu sou um leigo nestas matérias mas atrevo-me a lançar as premissas que, na minha opinião, devem estar presentes neste novo sistema:
1. Qual a definição de pensionista? No meu entender deverá ser aquele indivíduo que, por razões objectivas, não tem capacidade de gerar o seu próprio sustento através da vida activa. O mesmo será dizer que a idade não é condição suficiente para ser pensionista.
2. Qual o valor da pensão? a pensão deverá ter um caracter de subsistência e não de prémio face ao desempenho durante a vida activa. Caracter de subsistência por razões de capacidade limitada do sistema e por razões de abrangência em condições dignas de um sector alargado da população. A subsistência de um idoso não deveria ser confundida com a subsistência dos seus descendentes, como por vezes se tem alegado. O valor da pensão não deve ter um caracter de prémio e portanto deve estar desligado do rendimentos durante a vida activa. O estado não tem que premiar o que já foi premiado pelo vencimento. O estado tem apenas de garantir uma vida digna aos necessitados. Atribuir uma pensão elevada a um indivíduo que teve acesso a rendimentos altos é imoral, não contribui para a diminuição das desigualdades nem para a poupança.
Suzana
Com efeito, Caixa Geral de Aposentações e Regime Geral de Segurança Social tiveram até agora modelos de financiamento diferentes. O segundo para não entrar em ruptura vai ser financiado com impostos porque as contribuições (TSU) não são suficientes. Mas ambos sofrem dos mesmos problemas, as pensões estão a crescer e o esforço financeiro é cada vez maior. No que toca a benefícios a convergência está a fazer o seu caminho.
Há vários países da Europa que modificaram os seus sistemas de pensões, inclusive no que se refere ao modelo de financiamento e à partilha de responsabilidades e riscos entre Estado e trabalhadores/reformados.
As alterações de 2007 no Regime Geral de Segurança Social que o governo de então rotulou de "reforma" foram alterações paramétricas, isto é, não modificaram o modelo de financiamento. Com a alteração da fórmula de cálculo e a introdução do "factor de sustentabilidade" resultaram reduções nas pensões e menor e responsabilidades para o Estado, atirando para a frente a data de ruptura do sistema, as projecções foram feitas com pressupostos habituais, longe de se querer admitir que o país teria problemas de crescimento económico, elevadas taxas de desemprego e que o endividamento não teria limites. A ruptura é hoje uma realidade, agora já não é possível utilizar os mesmos argumentos para que tudo fique na mesma.
Caro Rui Fonseca
Tem toda a razão, os incentivos políticos foram direccionados para a aquisição de casa própria. Assim se vendeu a democracia e a prosperidade. Os agentes económicos reagem a incentivos, é por isso que as políticas públicas populistas e demagógicas conduzem a resultados no longo prazo insustentáveis.
Em Portugal, as políticas de incentivo à poupança para a reforma foram sempre ziguezagueantes, ao sabor das necessidades orçamentais de conjuntura, nunca houve uma verdadeira aposta na poupança privada para a reforma, a instabilidade e a imprevisibilidade fiscais são prova disso. E prova disso é, também, o facto de os incentivos criados apenas aproveitarem quem tem rendimento disponível e pagava impostos. Realmente, um entendimento, no mínimo, discriminatório.
Caro Agitador
Concordo consigo. É a reforma das reformas pelas razões que apontou. Mas é uma reforma que requer estudo e preparação, debate e consenso político e social. Não se trata de um qualquer decreto-lei, trata-se de um assunto que interessa a todos, a começar pelos cidadãos. A falta de sociedade civil e o paternalismo e omnipresença do Estado são factores que em nada ajudam a fazer a mudança.
Relativamente aos seus pontos, a conceito de reforma que está no nosso ordenamento jurídico está ultrapassado. A reforma estava associada a uma situação de velhice, de inactividade para o trabalho, de "fim da linha", sem perspectivar outras ocupações do tempo e do saber. De acordo, a idade não é suficiente para determinar a qualidade de pensionista. Mais importante é perceber o tipo de trabalho que é útil e proveitoso ao longo do ciclo de vida, da juventude à velhice. Quanto ao segundo ponto, estou de acordo que o Estado deve assegurar pensões que permitam uma vida digna com um determinado padrão de qualidade de vida. A ideia de fixar um máximo deve ser discutida. Mas porquê apenas aos necessitados? Os necessitados na vida activa ou na reforma? É importante que todos tenham incentivos para trabalhar, fazer descontos para a segurança social e poupar para a reforma. Não havendo regras, o incentivo é para gastar e não para poupar. No limite, todos poderíamos ser necessitados e acudidos pelo Estado.
Cara Margarida
Tocou no ponto sensível do actual sistema, que está baseado na ideia de incentivar os descontos para a SS e assim sustentar o sistema. Essa é uma ideia ultrapassada, ninguém acredita na preparação de um futuro a 30 anos e que depende da gestão do estado. E mesmo que seja uma entidade privada a gerir, a tendência recente é aceitar a incerteza do futuro. E é importante não esquecer que este sistema de incentivos à poupança ou seja lá o que for, consomem muitos recursos necessários ao investimento.
Relativamente ao problema das pessoas gastarem e não pouparem, é uma preocupação tipicamente paternalista que como sabemos é tão inibidora da iniciativa de cada um e da assunção das responsabilidades dos cidadãos. Estes, mais tarde sentem-se frustrados pela sua incapacidade de resolver problemas e pela incapacidade do Estrado os proteger.
Está na hora de não cairmos sempre nos mesmos vícios de raciocínio que nos levam sempre ao mesmo tipo de problemas. Problemas imensamente diagnosticados, ao longo de gerações e que nos remetem para o desaparecimento como povo.
A menos que não estejamos a falar de reformas, mas sim de retoques!
Caro Agitador
"E é importante não esquecer que este sistema de incentivos à poupança ou seja lá o que for, consomem muitos recursos necessários ao investimento", mas justamente a poupança para a reforma sendo uma poupança estável e de longo prazo é canalizada para o financiamento da economia, contribuindo para o crescimento económico e, consequentemente, para o aumento do bem-estar.
Em termos macro-económicos e a prazo será verdade. Então o que dalhou no actual sistema?
Caro Agitador
Correu mal muita coisa. A crise ilustra bem os erros.
Quanto à poupança e ao investimento, a poupança foi substituída por consumo e o investimento foi financiado com recurso ao endividamento.
Quanto à segurança social, a baixa crescente da natalidade mostra bem a ligeireza com que este assunto foi ignorado. Apenas para dar um exemplo.
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